Resumos

Avaliação dos Fatores Ambientais no Desenvolvimento Corporal de Cordeiros Deslanados da Raça Morada Nova

Antônio Amaury Oriá Fernandes¹ 1 Professor do Instituto CENTEC e Professor Adjunto da Faculdade de Veterinária, Universidade Estadual do Ceará. E.mail: oria@centec.org.br , David Buchanan² 1 Professor do Instituto CENTEC e Professor Adjunto da Faculdade de Veterinária, Universidade Estadual do Ceará. E.mail: oria@centec.org.br , Arturo Bernardo Selaive-Villarroel³ 1 Professor do Instituto CENTEC e Professor Adjunto da Faculdade de Veterinária, Universidade Estadual do Ceará. E.mail: oria@centec.org.br

RESUMO -Foram analisados registros de um rebanho de ovinos da raça Morada Nova, coletados num período de 11 anos (1981 a 1991), com o objetivo de avaliar os efeitos de ambiente sobre as características de crescimento dos cordeiros. Os efeitos de ano de nascimento (A), sexo do cordeiro (S), tipo de nascimento (T) e peso da ovelha ao parto (P) foram importantes fontes de variação para explicar as diferenças nos pesos corporais ao nascimento (PN), ao desmame (PD), aos seis meses (PM6) e aos 12 meses de idade (PM12). Os cordeiros machos foram mais pesados que as fêmeas em todas as idades estudadas. Cordeiros nascidos e criados como simples (SS) pesaram mais que os nascidos duplos e criados como simples (GS) e os nascidos e criados como duplos (GG). A idade da ovelha (I) teve efeito significativo sobre PN, PD e PM6. Concluiu-se que práticas de manejo alimentar devem ser utilizadas para reduzir os efeitos dos fatores ambientais, como ano de nascimento, tipo de nascimento e peso da matriz ao parto, no desenvolvimento corporal dos cordeiros. Fatores de ajuste para sexo do cordeiro, tipo de nascimento e idade da ovelha devem ser estimados e considerados em programas de seleção, a fim de avaliar melhor o crescimento dos cordeiros da raça Morada Nova.

Palavras-chave: ovino deslanado, desenvolvimento corporal, fatores ambientais

Environmental Effects on Growth Rate of Morada Nova Hair Lambs in Northeastern Brazil

ABSTRACT - Records from an unselected flock of Morada Nova sheep collected over an 11-year period (1981 to 1991) were used to evaluate environmental sources of variation affecting growth traits. The effects of year of birth to yearling (A), sex of lamb (S), type of birth (T), and weigth of ewe at lambing (P) were important sources of variation to explain differences in weigth at birth (PN), weaning (PD), six- months (PM6) and 12 months (PM12) of age. Males were heavier than female lambs at all ages. Single lambs born and raised as singles (SS) weighed more at all ages than twins raised as singles (GS) or twins raised as twins (GG). Age of ewe at lambing (I) had a significant effect on PN, PD, and PM6. Results suggest that nutritional management should be improved to reduce the environmental effects such as year of birth, type of birth and weight of ewe lambing. Adjustment factors for sex of lamb, type of birth/rearing and age of ewe at lambing need to be estimated and considered in selection programs to improve growth performance of Morada Nova lambs.

Key Words: hair sheep, growth traits, environmental factors

Introdução

Os ovinos Morada Nova constituem uma das principais raças nativas de ovinos deslanados do Nordeste do Brasil. São explorados para carne e pele, sendo esta altamente apreciada no mercado internacional. Por serem animais de pequeno porte e bem adaptados às condições climáticas do semi-árido, são importantes nas pequenas propriedades, onde constituem fonte de proteína na alimentação da população rural.

O peso corporal e a sobrevivência das crias são aspectos de significância econômica na criação (BRADFORD, 1985), sendo muito importante o conhecimento das diversas fases de crescimento que são consideradas na seleção animal. Programas de seleção e/ou de cruzamentos para melhoria da eficiência na produção requerem o conhecimento do crescimento dos animais, bem como a influência dos efeitos genéticos e ambientais sobre o mesmo.

Apesar da importância da ovinocultura no Nordeste, poucos estudos têm sido feitos em relação à caracterização e ao desenvolvimento corporal da raça Morada Nova. Os objetivos deste trabalho foram estudar o desenvolvimento corporal dos cordeiros da raça Morada Nova-pelagem vermelha, do nascimento até um ano de idade, e avaliar a importância dos fatores ambientais que influenciam o crescimento.

Material e Métodos

Os dados foram provenientes dos registros de nascimento de cordeiros na Fazenda Experimental Iracema situada no município de Quixadá, Estado do Ceará e pertencente à Empresa de Pesquisa Agropecuária do Estado do Ceará-EPACE. Foram utilizadas 2755 informações de pesos ao nascer de cordeiros Morada Nova, no período de 1981 a 1990, provenientes de 806 diferentes ovelhas. As matrizes foram acasaladas com um total de 76 carneiros, com número desigual de reprodutores utilizados em cada ano. O nascimento dos cordeiros ocorreu nos meses de abril e maio e o desmame, de agosto a setembro, com aproximadamente 112 dias de idade. As práticas de manejo foram similares em todos os anos de observação, sendo os cordeiros mantidos com as ovelhas em pastagem nativa (caatinga) até o desmame e, posteriormente, separados por sexo em piquetes diferentes, porém em condições similares de manejo e alimentação até completarem um ano de idade.

Os dados para avaliar o desenvolvimento corporal foram: peso ao nascimento (PN), peso ao desmame (PD), peso aos seis meses de idade (PM6) e peso a um ano de idade (PM12). Ajustes individuais de PD, PM6 e PM12 para 112, 180 e 365 dias, respectivamente, foram efetuados antes das análises usando equações para cada peso em função das idades estudadas. Do total dos 2755 cordeiros nascidos, 1020 (37%) nasceram de parto duplo e apenas 27 (menos de 1%), de parto triplo, razão pela qual estes últimos foram considerados, para efeito de análises estatístico, como duplos.

O número de cordeiros estudados, nas diferentes faixas etárias avaliadas, é apresentado na Tabela 1. Os dados de peso corporal foram analisados pelo método dos quadrados mínimos para dados com freqüências desiguais nas subclasses, segundo os programas LSMLMW e MIXDML (HARVEY, 1990). O modelo linear utilizado para avaliar os fatores ambientais que influenciam os diferentes pesos corporais foi o seguinte:

em que: Y_ijklmn = valor observado para peso ao nascimento (PN), peso ao desmame (PD), peso aos 6 meses (PM6) e peso aos 12 meses (PM12) de idade do animal n, do sexo k, oriundo do tipo de parto l, filho do reprodutor i e da ovelha com a idade m, no ano j; µ = média geral da característica em estudo; R_i = efeito aleatório de reprodutor i; A_j = efeito fixo do ano de nascimento j (j=1,.....,10); S_k = efeito fixo do sexo da cria k (1 = macho, 2 = fêmea); T_l= efeito fixo do tipo de nascimento/criação l do cordeiro (para PN: S = simples, D = duplo; para PD, PM6 e PM12: SS = cordeiro nascido simples e criado simples; GS = cordeiro nascido duplo e criado simples; GG = cordeiro nascido duplo e criado como duplo); I_m = efeito fixo da classe da idade da mãe m (classe 1 = ovelhas < 2 anos; classe 2 = 2 a <3 anos; classe 3 = 3 a <4 anos, .......; classe 6 = > 6 anos; (AT)_il; (ST)_kl; (IT)_ml = interações duplas entre os efeitos anteriores; P_n = efeito do peso da ovelha ao parto (covariável); E_ijklmno = erro aleatório, normal, independentemente distribuído, com média zero e variância s².

Resultados e Discussão

De acordo com o resultado da análise de variância apresentado na Tabela 2, o peso corporal ao nascimento (PN), ao desmame (PD), aos seis meses (PM6) e aos 12 meses de idade (PM12) foi influenciados (P< 0,01) pelos efeitos de reprodutor, ano do nascimento (A), sexo do cordeiro (S), tipo de nascimento (T), idade da ovelha (I) e peso da ovelha ao parto (PO). Das interações estudadas, AxT (ano de nascimento x tipo de nascimento) foi significativa (P<0,01) para PD, PM6 e PM12, enquanto IxT (idade da ovelha x tipo de nascimento) foi significativa (P<0,05) somente para PD e PM6.

As médias de peso corporal ajustadas pelo método dos quadrados mínimos, segundo o ano de nascimento, sexo do cordeiro, tipo de nascimento e a idade da ovelha, são apresentadas na Tabela 3. A média geral do PN, baseada em 2755 observações, foi de 2,21 ± 0,01 kg, com variações significativas entre anos. Cordeiros machos foram mais pesados (P<0,01) ao nascimento do que as fêmeas (2,26 vs 2,16 kg), da mesma forma que os cordeiros nascidos de parto simples foram significativamente (P<0,01) mais pesados (2,44 ± 0,02 kg) que os nascidos de partos duplos (1,97 ± 0,02 kg).

O peso ao nascimento aumentou com a idade das ovelhas, observando-se os cordeiros mais leves nas matrizes com idade inferior a 2 anos (Tabela 3). Por outro lado, o peso corporal das ovelhas ao parto (P) influenciou significativamente (P<0,05) o PN dos cordeiros, sendo o coeficiente de regressão linear do P para PN de 0,03 ± 0,0.

O peso médio dos cordeiros ao desmame (PD), baseado em 2267 observações, foi de 10,93 ± 0,09 kg, com diferenças significativas (P<0,01) entre anos (Tabela 2). Os cordeiros machos foram 0,31 kg mais pesados ao desmame que as cordeiras fêmeas. O contraste linear entre as médias de peso ao desmame dos cordeiros nascidos de parto simples e criados como únicos (SS), em relação aos de partos duplos nascidos e criados como gêmeos (GG) e/ou criados como único (GS), foi significativo (P<0,05). Outro contraste mostrou que cordeiros GS tiveram maior PD (P<0,05) do que os GG.

A idade da ovelha influenciou significativamente (P<0,05) o PD, variando de 10,58 ± 0,20 kg para cordeiros nascidos de ovelhas acima de 6 anos a 11,30±0,13 kg para os nascidos de ovelhas de 2 a 3 anos de idade. O peso da ovelha ao parto influenciou também significativamente (P<0,05) o PD. A regressão linear do PD em relação ao P foi significativa positiva e igual a 0,14±0,01.

Observou-se também interação significativa entre AxT (P<0,01). Os cordeiros GG nascidos em 1983, 1984 e 1985 apresentaram os menores pesos ao desmame (8,22±0,27, 8,31±0,27 e 8,40±0,35, respectivamente), enquanto os nascidos como SS em 1981 e 1990 foram os mais pesados (13,39±0,48 e 13,23±0,27 kg, respectivamente).

A interação IxT também influenciou significativamente o PD. A análise de contraste linear mostrou que cordeiros SS nascidos de ovelhas de <2 e >6 anos foram significativamente (P<0,05) mais leves que os nascidos de ovelhas com idade entre >2 e <6 anos. Entretanto, cordeiros GG nascidos de ovelhas dos diferentes grupos de idade apresentaram PD similares.

A média de peso dos cordeiros aos seis meses de idade (PM6) foi de 12,80 ± 0,11 kg, com variações entre anos de 11,45 ± 0,28 kg (1984) a 13,98 ± 0,36 kg (1987), conforme observa-se na Tabela 2. Nesta idade, os cordeiros machos foram mais pesados que as fêmeas (13,00±0,13 kg vs 12,60±0,13 kg). Os cordeiros SS atingiram, em média, 14,08±0,10 kg, enquanto os cordeiros GS e GG pesaram, respectivamente, 12,65±0,24 e 11,68±0,14 kg.

Os PM6 dos cordeiros aumentaram de 12,83±0,18 kg para os nascidos de ovelhas <2 anos à 13,24±0,15 kg para os oriundos de matrizes de >3 anos de idade. O peso da ovelha ao parto também teve efeito significativo sobre PM6 (b= 0,17±0,01), com influência significativa da interação IxT. Cordeiros SS nascidos de ovelhas de <2 e >6 anos (13,70 ± 0,13 e 13,41± 0,25 kg, respectivamente) apresentaram menor PM6 que os cordeiros nascidos de ovelhas entre >2 e <6 anos (14,11 ± 0,21 a 14,46 ± 0,14 kg). Por outro lado, o PM6 dos cordeiros GG nascidos de ovelhas com idade superior a cinco anos foram mais leves que os nascidos de ovelhas com menor idade.

Os cordeiros ao atingirem um ano de idade (PM12) tiveram média de peso corporal de 18,60±0,20 kg. As fontes significativas de variação para PM12 foram ano de nascimento, sexo da cria, tipo de nascimento, peso da ovelha ao parto e a interação AxT. A idade da ovelha (I) e as interações SxT e IxT não influenciaram significativamente (P>0,05) PM12 (Tabela 2).

O PM12 dos cordeiros machos foi mais pesado (P<0,01) do que as fêmeas, com peso superior em 0,70 kg, em média (18,95±0,23 e 18,25±0,23 kg, respectivamente) e os cordeiros SS foram mais pesados (19,66 ± 0,18 kg( que os cordeiros GG e GS (17,63 ± 0,26 e 18,51 ± 0,41 kg, respectivamente). Os contrastes lineares do PM12 dos cordeiros SS em relação aos GG e GS e entre cordeiros GS e GG foram significativos. A regressão linear do PM12 em relação ao peso da ovelha ao parto (PO) foi também significativamente positiva e igual a 0,17± 0,02.

Os resultados descritos mostram que os fatores ambientais afetam o crescimento dos cordeiros da raça Morada Nova, do nascimento a um ano de idade. O efeito ano foi um fator importante em todas as fases do crescimento dos cordeiros. A influência do ano é um fator esperado pelo relatado na literatura (DICKERSON e LASTER, 1975; KAUSHISH et al., 1990; BUVANENDRAN et al., 1992), bem como nas condições climáticas do Nordeste do Brasil. A influência do ano se produz por diversas ocorrências como a quantidade e distribuição das chuvas, problemas sanitários, práticas de manejo e disponibilidade de forragens. Durante o período experimental, a pluviosidade apresentou grandes variações entre os anos e dentre os meses do ano, incluindo três anos de seca, que certamente contribuíram para ressaltar ainda mais o efeito ano. Outro aspecto a considerar é a disponibilidade e deterioração da forragem através dos anos, considerando que a área experimental foi a mesma durante todo o período.

O peso corporal dos cordeiros observado nas diferentes fases do crescimento foi considerado muito baixo, quando comparado com o desenvolvimento de ovinos de clima temperado. Problemas de temperatura e alimentação podem ser considerados como fatores essenciais. Na região semi-árida do Brasil, os animais são mantidos a maior parte do ano somente em pastagens nativa, insuficiente para suprir as necessidades nutricionais, principalmente durante a época seca. Contudo, o maior peso observado dos machos sobre as fêmeas, em todas as fases de crescimento estudadas, concordam com os resultados obtidos por outros autores (FERNANDES, 1985; PEREIRA et al., 1987; OLIVEIRA, 1992). A superioridade no peso corporal dos machos é devida ao dimorfismo sexual comum a todas as espécies mamíferas na fase de desenvolvimento e na idade adulta. Porém, apesar da diferença significativa observada (P<0,01), o maior peso dos machos pode ser considerado pequeno em relação ao dos outros trabalhos consultados. Uma possível explicação para a pouca diferença encontrada é que, além das condições precárias de nutrição, o desmame dos cordeiros coincidiu com o inicio da época seca, conseqüentemente, os cordeiros machos não tiveram oportunidade para expressar seu maior potencial de crescimento.

Os resultados sobre o efeito do tipo de nascimento e/ou parto (T) sobre os pesos corporais, observados em todas as fases de crescimento neste trabalho, estão de acordo com os trabalhos publicados na literatura (MARTINEZ, 1983, MOLINA et al., 1991). Em geral, é esperado que cordeiros nascidos como simples (SS) apresentem maior crescimento que os nascidos como duplo e criados como simples (GS) e estes, por sua vez, cresçam mais que os nascidos e criados como duplos (GG). Este fato é devido à competição por leite. A maior disponibilidade de leite materno para os cordeiros SS e GS retarda o início do consumo de pasto em relação aos cordeiros GG, fato que pode explicar em parte as desvantagens dos cordeiros GG. Todavia, provavelmente pelo fato de terem nascidos mais leves, os cordeiros múltiplos apresentaram ganho de peso compensatório após o desmame, que fez diminuir proporcionalmente as diferenças observadas ao desmame, porém sem igualar-se aos nascidos de parto simples.

Conclusões

Fatores de ajuste como sexo do cordeiro, tipo de nascimento e idade da ovelha na parição devem ser estimados e considerados em programas de seleção, a fim de avaliar melhor o crescimento dos cordeiros da raça Morada Nova.

Práticas de manejo alimentar devem ser utilizadas para reduzir os efeitos dos fatores ambientais, como ano de nascimento, tipo de parto e peso da matriz ao parto, no desenvolvimento corporal dos cordeiros.

Referências Bibliográficas

Recebido em: 29/04/98

Aceito em: 31/05/01

² Professor Titular, Oklahoma State University - USA.

³ Professor Adjunto, Depto de Zootecnia/UFC. E.mail: selaive@ufc.br

Datas de Publicação

Histórico